Costureira acusada de roubo comprova álibi, apontando falhas no reconhecimento fotográfico. Desfecho do processo revela fragilidade probatória e erro judicial.
A defesa conseguiu reverter a situação da costureira presa injustamente, comprovando as falhas no reconhecimento fotográfico que a incriminava. O reconhecimento fotográfico é uma técnica complexa que pode apresentar equívocos, como no caso dessa mulher que foi absolvida pela 3ª câmara Criminal do TJ/CE.
O caso ressalta a importância de se analisar com cautela a identificação por imagem em processos judiciais, evitando injustiças. O reconhecimento fotográfico pode ser crucial em investigações, mas deve-se ter em mente que nem sempre é infalível, como ficou evidenciado nessa absurda prisão de uma gestante. É essencial que a justiça se baseie em provas concretas, evitando condenações indevidas.
Desafios do Reconhecimento Fotográfico na Identificação por Imagem
A mulher foi detida em dezembro de 2021, quando estava grávida de três meses, após ter sido acusada de envolvimento em um roubo à mão armada ocorrido em um restaurante em Fortaleza/CE, em julho daquele ano, no qual seis vítimas tiveram bens subtraídos por um casal de assaltantes.
As vítimas identificaram a costureira, com base exclusivamente em reconhecimento fotográfico, como uma das pessoas envolvidas no crime. Em abril de 2022, devido ao estágio avançado da gravidez, a acusada foi autorizada a aguardar o resultado do recurso em liberdade. Mulher foi presa grávida após ter sido reconhecida pelas vítimas por fotografia em procedimento que desrespeitou previsão do CPP.
(Imagem: Freepik) Fragilidade probatória A absolvição da acusada veio após a defesa provar que a ré passou o dia do crime em um churrasco na residência de sua ex-patroa, sem qualquer participação no crime. Também foi questionada pela defesa a condenação com base exclusivamente em fotografias mostradas pela polícia, sem aderência ao procedimento formal estabelecido no art.
226 do CPP, que exige medidas específica para garantir a precisão e a justiça do reconhecimento pessoal, incluindo a colocação da pessoa a ser identificada ao lado de outras com semelhanças físicas. Lacuna A revisão do caso pelo TJ/CE destacou a ausência de provas concretas além do questionável reconhecimento fotográfico.
‘Segundo os relatos das vítimas, o ato criminoso foi perpetrado por um casal, com o homem usando máscara e a mulher desprovida desse acessório. Essa particularidade possibilitou a algumas das vítimas observarem as características físicas da mulher, que foi descrita como morena, de estatura baixa e com cabelo curto.
Em que pese às narrativas das vítimas, tal prova deixa à mostra uma lacuna probatória de irremediável efeito sobre o desfecho do processo, no caso, a realização de reconhecimento dissociado da ritualística prevista no art.
226 do Código de Processo Penal, o que, conforme recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, gera irreversível invalidade do ato.’ Na decisão, o tribunal enfatizou que, além do reconhecimento, não havia outras evidências como testemunhas adicionais, gravações de câmeras de segurança, confissões ou recuperação de itens roubados que pudessem vincular a mulher ao crime.
Os magistrados citaram precedentes do STJ e STF que invalidam o reconhecimento fotográfico como base exclusiva para a condenação, devido à sua natureza altamente sugestionável e a probabilidade de erros. Ressaltaram, ainda, a importância de aderir ao devido processo legal, fundamental para a integridade do sistema judicial e para a proteção dos direitos dos indivíduos.
‘O reconhecimento fotográfico caracteriza um total desrespeito à legislação processual penal e tem sido causa de diversas iniquidades judiciais, resultando, por vezes, na condenação de pessoas inocentes. O Poder Judiciário não pode nem deve compactuar com essa prática, sob pena de afronta ao postulado constitucional do devido processo legal’, concluíram.
Reconhecimento de pessoas A prisão com base exclusivamente em reconhecimento fotográfico é um tema recorrente em decisões do STJ e do STF. Ministros da Corte da Cidadania consideram que o reconhecimento em desconformidade com o procedimento estipulado pelo CPP torna-se campo fértil para o erro judicial.
Em 2020, a 6ª turma do STJ firmou o entendimento de que não é possível condenar alguém exclusivamente com base em um reconhecimento fotográfico. Desde então, até fevereiro de 2022, a Corte já havia proferido ao menos 90 decisões absolvendo réus pela fragilidade desse tipo de prova.
Em dezembro de 2022 o CNJ estabeleceu diretrizes pelo ato normativo 0007613-32.2022.2.00.0000 para orientar o reconhecimento pessoal e evitar erro que condenam pessoas inocentes, e, muitas vezes, reforçam o racismo estrutural, já que, segundo dados do projeto ‘Justiça para os inocentes’ da OAB/RJ, 70% de acusados injustamente por falhas no reconhecimento fotográfico são pessoas negras.
Entre as medidas que devem ser observadas estão a preferência pelo reconhecimento presencial, com a presença de quatro pessoas ou a apresentação de quatro fotografias, a gravação do procedimento de reconhecimento e a disponibilização dessa gravação às partes envolvidas, além da coleta de autodeclaração racial de reconhecedores e investigados. Processo: 0266641-09.2021.8.06.0001 Veja o acórdão.
Fonte: © Migalhas
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